sábado, 14 de abril de 2018

DURA REALIDADE: Precarização da advocacia



Vulneração da dignidade profissional e malferimento dos direitos humanos sociais dos advogados no Brasil


Os fatos ensejadores da vulgarização e desvalorização da advocacia ensejam violações de direitos humanos e retratam a situação vivenciada pela maioria dos advogados brasileiros, que vêm enfrentando no dia a dia profissional uma crescente onda de precarização e proletarização da advocacia, bem como que de vulneração da dignidade, independência profissional e de suas respectivas prerrogativas legais.

Os advogados brasileiros historicamente sempre gozaram de prestígio e ocuparam um elevado status social por exercerem funções imprescindíveis à vida política, social e por serem um dos pilares do Estado de Direito, da administração da justiça e da defesa dos direitos humanos no país, direitos humanos estes que juraram solenemente defender.

Ocorre que atualmente no Brasil, grandes escritórios de advocacia têm sido condenados por contratar advogados considerados empregados como sócios ou associados da banca. Os processos são resultado de uma ofensiva do Ministério Público do Trabalho (MPT) contra uma prática ilegal comum no mercado de prestação de serviços jurídicos local.

Além da modalidade precária acima descrita, ainda existe a figura do advogado audiencista. O advogado audiencista trabalha para uma empresa ou um grande escritório e recebe um pequeno valor por cada audiência, chamados de “honorários de fome” e esse profissional tem se multiplicado por todo o Brasil. Com a saturação do mercado de trabalho, ser audiencista acaba sendo uma saída mais viável e imediata, principalmente para os profissionais recém-formados, e em especial no interior.

Em geral, escritórios ou empresas recrutam os audiencistas via sites na internet, por e-mail ou indicação de outros colegas. A maioria fica de plantão nos fóruns e recebe, em média, entre R$ 7,00 (sete reais) ou R$ 50 (cinquenta reais) por cada audiência realizada. Destaca-se, que por causa da precariedade do trabalho, muitos advogados não estão recolhendo as contribuições previdenciárias, por não terem condições de pagar e aguardam uma velhice na miséria sem ter direito e acesso aos benefícios previdenciários. Há também os casos de advogadas laborando até o último dia de gravidez para garantir a sobrevivência da sua família. Um absurdo!

Nota-se que há uma polêmica gerada em torno desses colegas de profissão, cuja atuação é apontada como indício da precarização da profissão e do aviltamento dos honorários advocatícios, porém a hipossuficiência do advogado explorado não vem pela falta de conhecimento, mas pelo medo de ser punido e da necessidade de sobreviver do seu trabalho. Esses advogados, muitas vezes recém-formados, têm medo de entrar com ações e não conseguir mais trabalho.

Não obstante tudo isso, a dignidade do trabalho do advogado também sendo malferida pelo Poder judiciário brasileiro. Recentemente um juiz do Rio Grande do Sul considerou como suficiente para remunerar o trabalho de um advogado em ação Declaratória de Inexistência de Débito, o valor de R$ 7,00 (sete reais).

No caso acima descrito, uma consumidora buscou o Judiciário após receber uma cobrança de conta telefônica no valor de R$ 34,99. Afirmando que seu plano era pré-pago, e que recusou a oferta para migrar para o pós-pago, a autora solicitou em juízo que o débito fosse declarado inexistente.

O advogado, se sentindo desvalorizado, apresentou embargos de declaração informando que o valor era irrisório e que deveria ser majorado, nos termos do artigo 85, parágrafo 8º do Código de Processo Civil, mas não obteve êxito.

No despacho, o juiz afirmou que "o magistrado fixou os honorários no percentual que entende ser suficiente para remunerar o profissional que atuou junto à causa, levando-se em conta o trabalho realizado". Segundo a decisão do magistrado, caso o advogado entenda que o valor esteja incorreto, deve buscar a reforma por meios próprios, e não por embargos de declaração. (Processo 0001042-46.2017.8.21.2001).

É ponto pacífico na doutrina e na jurisprudência que os honorários advocatícios são dotados de natureza alimentar, entendimento também incorporado ao Novo Código de Processo Civil, pois equivalentes ao salário do trabalhador.

É sabido ainda que o aviltamento dos honorários atenta contra a dignidade e a importância do trabalho da classe advocatícia, vez que importa em verdadeira violação à disposição legal expressa, bem como atenta contra os princípios constitucionais da razoabilidade e da isonomia, os quais devem nortear todos os atos judiciais.

O Estatuto da Advocacia é claro ao afirmar ser devida justa remuneração ao advogado por seu trabalho. O Judiciário, ao fixar valores irrisórios, desestimula o bom exercício profissional. Garantir uma remuneração justa ao advogado é uma das principais prerrogativas da classe.

Elucida-se que o magistrado que fixa honorários em valores irrisórios e fora da previsão legal, por se sentir intranquilo, imaginando que o advogado está percebendo valores altos, que largue a toga e venha advogar, mas que evite malferir a dignidade do trabalho desses profissionais.

Destaca-se que qualquer relação de trabalho deve ser baseada nos limites constitucionais, sob o risco de aniquilamento ou mitigação dos direitos e garantias fundamentais do trabalhador, o que leva ao entendimento de que é a Constituição Federal o vetor central para que se alcance de fato a dignidade da pessoa humana.

A atividade profissional do advogado extravasa a fronteira do direito, sendo considerada uma atividade político social, possuindo múnus público, teor ético e acima de tudo, constitui a via direta de acesso do povo ao judiciário. Se a dignidade do trabalho do advogado é malferida, estaremos diante de um colapso da independência da advocacia.