Quem
chorou por Vitor, o bebê indígena assassinado com uma lâmina enfiada no
pescoço?
Nesse
dia seis de janeiro, ao celebrar com a Folia de Reis a visita dos Magos ao
menino que amedrontou Herodes, me veio o gosto amargo da derrota sofrida em
Imbituba, há apenas uma semana: Herodes mandou degolar mais um menino. Com o
requinte de crueldade de ser a criança atacada justamente onde nos sentimos
maior segurança – o colo materno.
Se
Vitor fosse branco e estivesse com a família em uma praça do Rio ou São Paulo,
o crime hediondo estaria em todos os noticiários e provocaria repulsa maior do
que as fotos de prisioneiros prestes a serem degolados por terroristas do
Estado Islâmico. Mas Vitor é Kaingang e só foi morto porque índio não tem valor
para a sociedade capitalista. Não se sabe até o momento de quem é a mão que
passou o estilete mortal na garganta do menino. Sabemos, porém, quem são os
mandantes do assassinato: grandes proprietários e proprietárias de terra que
não respeitam o direito dos Povos Indígenas a terem seu próprio modo de
produção e de consumo. Tal como o Herodes bíblico, eliminam até mesmo crianças
que possam um dia ameaçar seu poder econômico.
Em
outros tempos a Igreja católica não ficaria em silêncio diante de um crime como
esse. A nota do CIMI seria acompanhada de uma nota dos bispos e repercutiria
por dezenas de milhares de comunidades de base de todo o Brasil. Celebraríamos
os Reis magos, com certeza, mas não deixaríamos em silêncio o crime cometido
por Herodes apenas uma semana antes. Pediríamos perdão por não termos evitado,
com uma legislação e uma educação corretas, o preconceito contra os povos
indígenas e nos comprometeríamos com os Santos Reis a tomar outro rumo nos
caminhos da história. O sofrimento daquela pequena família Kaingang ao ver seu
filho caçula esvaindo-se em sangue deveria dar um sentido mais realista à
celebração da Epífania: aprender com os Santos Reis da bela tradição popular, a
ver naquela criança degolada o anúncio da Libertação dos Povos Indígenas.
Que
neste ano da Misericórdia, ao passar pela porta do jubileu e entrarmos numa
igreja, sejamos chamados à conversão e saiamos pela mesma porta para assumir a
defesa da vida das crianças Kaingang, Kayová, Mundurucu e de todos os outros
povos que há quinhentos anos querem nos ensinar a viver em paz com eles.
Fonte:
domtotal
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