Na última terça-feira (18) o presidente Jair Bolsonaro deu um golpe de misericórdia na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, que somente no ano que vem teria a sua plena vigência em todo o país.
Ele sancionou, com cinco vetos, a nova lei Lei 13.846, aprovada pelo Congresso, a partir da análise de uma Medida Provisória encaminhada pelo Executivo (MP 871/2019), que criou um programa de revisão de benefícios do INSS para combate fraudes. Nela havia um dispositivo que impedia o governo de liberar dados de segurados do INSS para atividades comerciais e financeiras de empresas privadas.
O presidente vetou o Artigo 124-E, que impedia esse repasse de informações gerais de segurados do INSS (pessoais, trabalhistas e financeiras), para qualquer empresa ou pessoa física, interessadas em fazer “qualquer atividade de marketing”.
Na prática, ao vetar, o presidente liberou para bancos, corretoras de seguro ou empresas comerciais e de marketing digital – seja para qual for o ramo ou atividade econômica – o acesso aos nomes, endereços, telefones, e-mails, etc; de todos os segurados do INSS. Para que sejam disparadas mensagens com ofertas de serviços.
Estamos falando de um banco de dados estimado em 65,1 milhões de pessoas físicas (dados de 2017), que são contribuintes do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Não estão computadas as empresas, que também poderão receber a partir de agora ações de marketing direcionado.
O Artigo 124-E , que foi vetado por Bolsonaro dizia o seguinte:
Art. 124-E É vedada a transmissão de informações de benefícios e de informações pessoais, trabalhistas e financeiras de segurados e beneficiários do INSS a qualquer pessoa física ou jurídica, diretamente ou por meio de interposta pessoa, física ou jurídica, para a prática de qualquer atividade de marketing, oferta comercial, proposta, publicidade direcionada a beneficiário específico ou qualquer tipo de atividade tendente a convencer o beneficiário do INSS a celebrar contratos e obter captação de clientela.”
Ao justificar o veto, a equipe econômica alegou que a decisão foi tomada, porque A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais ( Lei 13.709/2018) já disciplinaria a questão do tratamento de dados pessoais “com o objetivo de proteger os direitos fundamentais da liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da pessoa natural”.
Por conta disso, o dispositivo previsto na Lei 13.846/2019, vetado por Bolsonaro estaria conflitando com o Inciso IV do artigo 7º da Lei Complementar nº 95/1998, que impede o disciplinamento de um assunto que já está previsto em outra lei.
“Ademais, o impedimento de realização de oferta de qualquer tipo de crédito pessoal por parte das instituições conveniadas ao INSS, tem o potencial de estimular a divulgação de produtos por instituições não conveniadas, causando um desequilíbrio concorrencial no mercado em ofensa ao princípio da livre iniciativa com espeque no Art. 170 da Constituição da República”, diz a justificativa do veto.
Aqui a justificativa do governo para vetar parece mais o samba do crioulo doido, do que o real interesse em promover a “livre iniciativa” ou “concorrência”. Primeiro, porque o artigo vetado não trata de impedir a oferta de crédito pessoal ou qualquer serviço financeiro ou comercial. O artigo apenas impedia que instituições privadas tivessem acesso às informações particulares de cidadãos em bancos de dados do INSS.
Em segundo, fica para ser eventualmente debatido futuramente se é papel do governo se meter em disputa comercial entre empresas privadas, usando como poder mediador de eventuais disputas os bancos de dados oficiais. Até então, disputas concorrenciais na Economia eram assuntos restritos ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica e a Secretaria de Direito Econômico. Abrir brechas na Lei Geral de Proteção de Dados, antes mesmo dela entrar em vigor, com esse argumento utilizado agora é uma novidade. Se essa desculpa “cola”, isso é outra questão.
Talvez o Advogado Walter Capanema, especialista em Direito Digital e o novo Coordenador de Defesa das Prerrogativas nos Processos Eletrônicos e Inteligência Artificial da OAB/RJ, tenha elucidado essa súbita disposição do governo de liberar informações pessoais de contribuintes do INSS para o mercado privado, sem a devida autorização dos donos desses dados.
“Como a Lei Geral de Proteção de Dados somente entrará em vigor em agosto do ano que vem (2020), me parece que é uma medida para por em operação uma série de coisas, antes que a nova legislação entre em vigor e proíba essas atividades. As razões apresentadas para o veto são até contraditórias. Primeiro fala que vetou porque tem uma lei de proteção de dados que já regulamenta isso. Mas aí embaixo fala que estaria vetando para garantir a competição. O importante não é a competição entre empresas conveniadas ao INSS. O importante no artigo vetado era a proteção dos dados pessoais, que acabou caindo com o veto presidencial”, explicou Capanema.
Fonte: capitaldigital
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