"Só penso nas fraudas", diz Gleide Moreira, que tem filha de três meses diagnosticada com microcefalia (Foto: Marina Silva/CORREIO) |
Em busca de apoio, mães
tentam ter acesso a benefício federal para criar bebês
Esther,
a sétima filha da cozinheira Gleide Moreira, 38 anos, nasceu no dia 7 de
dezembro de 2015, na Maternidade Climério de Oliveira (MCO), em Nazaré. Naquele
mesmo dia, no Iperba, em Brotas, nascia Davi, primogênito da manicure Vilma
Reis, 21. Foi só no hospital, ao vê-los pela primeira vez, que as mães
descobriram que os dois tinham microcefalia.
Hoje,
Esther e Davi são testemunhas de uma batalha diária enfrentada por suas
famílias. À frente dessa luta, mães que deixaram seus empregos para dedicar a
vida aos novos rebentos e que aguardam pela concessão de uma ajuda de custo
pelo governo federal que vai aliviar as despesas.
As
duas deram entrada no pedido de Benefício de Prestação Continuada (BPC),
concedido a pessoas com deficiência e a idosos com 65 anos ou mais. Na Bahia,
até dezembro de 2015, 408 pessoas recebiam o BPC por causa da microcefalia. A
assessoria do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), responsável pelo
pagamento do benefício, não soube informar quantos foram concedidos ou
solicitados este ano.
“Só
penso nas fraldas”, diz, preocupada, a cozinheira Gleide. Esther, com quase
três meses, gasta oito fraldas por dia. Logo no começo da gestação, lá pelo
terceiro ou quarto mês, Gleide precisou parar de trabalhar. Nunca teve uma
gestação como a de Esther. Tinha enjoos o tempo todo.
Pouco
tempo depois, descobriu que, na verdade, estava grávida de gêmeos. Mas, ali
mesmo, veio o baque. Um dos filhos morreu no útero. No meio disso tudo, teve
zika. “Esther nasceu roxinha, quase sem fôlego de vida”, lembra Gleide, sem
segurar as lágrimas.
Todo
o sustento financeiro da família fica a cargo do marido, que é carpinteiro e
trabalha fazendo bicos. No dia 22 de fevereiro, conseguiram fazer a perícia
médica para ter o BPC. Dez dias depois, deveriam receber, em casa, uma carta
informando se estão aptos ou não. Até hoje, nem sinal da correspondência. Na
última sexta-feira, informaram que deveria chegar até o dia 15.
Gleide
pega dois ônibus, três vezes por semana, para sair de Paripe até o Alto de Ondina, para fazer o tratamento
da filha no Núcleo de Atendimento à Criança com Paralisia Cerebral (NACPC).
Além de carregar Esther, leva a filha de 9 anos, Ingrid, a tiracolo. Se não
fosse a menina, além do outro filho de 12 anos, não teria nenhuma ajuda nos
cuidados diários com Esther.
“Eu
tenho que encarar a realidade. Você tem seis filhos normais e aí vem ela. Mas o
amor é igual. Não muda nada. Vejo esse negócio de aborto com microcefalia na
televisão e não apoio, não. É uma criança que não pediu para vir ao mundo, ela
não tem culpa”, conta a cozinheira, que é da Igreja Assembleia de Deus.
Greve
Vilma
e Davi também frequentam o NACPC três vezes por semana. Os dois moram na casa
de uma tia de Vilma, no Engenho Velho da Federação. Até hoje, o pai de Davi,
com quem não é casada, ficou só na promessa de que vai ajudar com os gastos do
filho. “Minha vida hoje é para cuidar dele, mas minha tia, que é faxineira,
ajuda como pode”.
Na
semana passada, Vilma ligou para tentar agendar um horário no INSS, a fim de
conseguir o BPC. “Só para 11 de julho. Eles disseram que estava tudo lotado por causa da greve”,
diz, referindo-se à greve dos peritos médicos do INSS, que foi de 4 de setembro
do ano passado a 22 de janeiro de 2016. A sorte é que, por enquanto, não faltam
fraldas - graças a um chá que fez ainda grávida.
A
dona de casa Thaise Galisa, 17, ainda vai entrar na fila do INSS. Precisa,
antes, providenciar o CPF de Charles, 2
meses. Nascido no dia 22 de dezembro, o bebê foi diagnosticado com microcefalia
aos seis meses de gestação. “A gente ficava o tempo todo se perguntando como
seria essa cabecinha que tanto falavam. E ele nasceu com 26 cm (circunferência
da cabeça)”.
Thaise
e Charles moram na casa do pai dela, na Boca do Rio. O pai do bebê, que é
frentista, paga a maior parte das despesas. Antes de terminar o 3º ano do
ensino médio, em 2015, ela queria cursar Medicina Veterinária ou Gastronomia.
Atualmente, isso não é mais objetivo. “Pretendo trabalhar, mas não mais fazer
faculdade. Não posso dividir a atenção que dou para ele (Charles)”, conta.
Mas
Charles trouxe muito mais para a vida dela. “Uniu minha família. Todo mundo só
vivia brigando. Hoje, meu pai está mais próximo. Eu e o pai dele (Charles)
também estamos ainda mais próximos”.
Segundo
a assessoria do INSS, as perícias foram afetadas por conta da greve. Durante a
paralisação, cerca de 40 mil deixaram de ser feitas. Um mutirão foi feito no
dia 24 de fevereiro, com a realização de 300 perícias, mas não há outro
previsto. Não há prioridade para bebês com microcefalia. Além disso, o governo
ainda deve normatizar como será a bolsa destinada às crianças com a condição.
Atualmente, apenas pessoas que preenchem os requisitos (veja ao lado ) podem
receber o benefício.
Benefícios
O
que é o Benefício de Prestação Continuada (BPC)?
É
um auxílio individual e não vitalício. A cada dois anos, há uma revisão para
saber se ainda há necessidade.
Quem
pode solicitar?
Idosos
com 65 anos ou mais e pessoas com deficiência. A renda mensal bruta familiar
per capita deve ser inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo - ou seja, menor
que R$ 220.
Como
requerer?
A
pessoa pode solicitar pelo telefone 135 e agendar um horário na agência do INSS
mais próxima. Também é possível solicitar pela internet, no site
www.previdenciasocial.gov.br.
Na
agência, qual é o procedimento?
A
pessoa deve preencher o formulário de solicitação, apresentar declaração de
renda familiar, comprovante de residência e os documentos listados abaixo. Será
realizada uma avaliação da deficiência. Essa chamada “perícia” será agendada
pelo INSS.
Quais
são os documentos necessários?
Além
do CPF, é preciso levar algum desses outros documentos: carteira de identidade,
certidão de nascimento ou casamento, certificado de reservista ou carteira de
trabalho.
Fonte:
correio24horas
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