O
magistrado de sobrenome Filho (*) era um ´pai´ para advogados, estagiários,
servidores etc. quando se tratasse de deixar correr um papo-furado no seu
gabinete. Quanto menos audiências de instrução, melhor para ele.
Marcava
uma tentativa de conciliação – e, se o acordo não fosse celebrado, determinava
que os autos voltassem "conclusos". E assim o processo ia para uma
pilha lenta onde repousava meses.
Quase
todos sabiam que o magistrado não gostava de sentenciar, a tal ponto que o
então presidente da própria associação estadual de classe reconhecia que “se
trata de um juiz que não gosta de processos".
Nesse
contexto, sempre que no topo da pilha surgisse um processo complicado – e se
uma ou ambas as partes fossem pessoas jurídicas - o ´doutor Filho´ lançava um
despacho padrão-evasivo: “apresentem, em 15 dias, documentos comprobatórios da
regularidade na MM. Junta Comercial do Estado. Após, abra o cartório, via nota
de expediente, prazos sucessivos de dez dias para a vista dos documentos
vindos”.
Em
outros momentos, o magistrado prolatava tradicionais despachos que o escrivão -
atento e espirituoso - já conhecia como corriqueiros e copiava para seu
implacável arquivo:
•
"Diga o autor sobre o pedido do réu";
•
"Intimem-se as partes para, em 15 dias, em prazos sucessivos, autenticarem
as cópias simples que existem nos autos";
•
“Fale o demandado sobre a pretensão do demandante";
•
“Especifiquem autor e réu as provas que pretendem ver produzidas";
•
“Justifiquem as partes a pertinência das provas requeridas”.
Certo
dia, um conceituado advogado, já cansado de tantos "diga o autor",
"diga o réu" - caprichou numa petição em papel amarelo, com letras
garrafais, impressas em vermelho e lascou: "As partes já cansaram de dizer;
por isso, diga agora o juiz quando vai prolatar a sentença".
O
juiz levou um choque com a petição que era, ao mesmo tempo, singela, objetiva,
irônica e ferina. E verdadeira!
Para
livrar-se do problema, o juiz encaminhou à Corregedoria, então, imediato pedido
de férias atrasadas. Foi designado um substituto, recém promovido à capital,
que recebeu como tarefa, sentenciar 60 ou 70 processos. O primeiro da pilha
empoeirada era aquele em que o advogado provocara o juiz a que, afinal, desse a
sentença. O magistrado substituto desincumbiu-se com sucesso total.
Como
a maioria das novelas tem um final feliz, na volta das suas férias, o ´Dr.
Filho´ foi promovido ao tribunal, por merecimento. E na Corte, com o vigor de
estagiários e assessores, nunca atrasou acórdãos.
(*)
O nome é fictício.
Fonte:
espacovital
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