OLAVO A. VIANNA ALVES FERREIRA
Procurador do Estado de São Paulo Doutor e Mestre em Direito do Estado
pela PUC-SP. Foi membro eleito do Conselho Superior da Procuradoria Geral do
Estado de São Paulo. Foi Professor de direito constitucional do Curso LFG.
Professor convidado de cursos de pós-graduação (PUC-COGEAE, UFBA, Escola
Superior do Ministério Público, JUSPODIVM, FAAP e USP-FDRP), orientador da
pós-graduação da Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo e
da pós-graduação de Processo Civil da USP-FDRP. Autor de livros. Avaliador de
Cursos de Direito e IES do Inep/MEC
Poderia nos citar alguns impactos do Novo CPC no Processo
Constitucional?
A título meramente exemplificativo, podemos citar a criação de novas
hipóteses do efeito vinculante dos precedentes no novo Código de Processo Civil
como uma das grandes novidades e cuja compatibilidade com a Constituição já é
questionada pela doutrina.
Os juízes e Tribunais observarão (art. 927 do NCPC): i) as decisões do
Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; ii) os
enunciados de súmula vinculante; iii) acórdãos prolatados: iii.i) na resolução
de demandas repetitivas (artigos 985, 987, § 2º do NCPC), assim também
considerados os proferidos em julgamento de recursos extraordinário e especial
repetitivos; iii.ii) em incidente de assunção de competência; iv) os enunciados
das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior
Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; e v) a orientação do
plenário ou do órgão especial a que estiverem vinculados os magistrados.,
incluindo o efeito vinculante do precedente proferido no incidente de
julgamento de casos repetitivos e do precedente proferido no incidente de
assunção de competência.
Não é novidade o efeito vinculante das decisões do Supremo Tribunal
Federal em controle concentrado de constitucionalidade e dos enunciados de
súmula vinculante, já previstos na Constituição. As demais hipóteses é que
terão a compatibilidade com a Constituição questionadas.
Com o NCPC teremos novas questões como as decisões com efeito vinculante
e os efeitos da mudança de entendimento.
Houve reforço do princípio do contraditório no art. 10 do NCPC ao
determinar que o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base
em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se
manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício,
sob pena de nulidade para alguns doutrinadores como Nelson Nery Jr.
Aplicando-se ao reconhecimento ex officio da inconstitucionalidade no recurso
extraordinário (art. 1.034 do NCPC).
Existem diversas outras questões, mas demandariam praticamente um livro.
Qual seu entendimento sobre a compatibilidade das previsões do efeito
vinculante com a Constituição? O artigo 927 do Novo CPC ao criar novas
hipóteses de efeito vinculante é compatível com a Lei Maior?
O efeito vinculante, no Brasil, surgiu com a Emenda Constitucional 7/77,
que atribuiu ao Supremo Tribunal Federal competência para a interpretação, com
efeito vinculante, de ato normativo (artigo 119, I, XXX, l, da Constituição de
1967/69, com a Emenda 7/77). Posteriormente, foi previsto no artigo 102,
parágrafo 2º, da Constituição Federal, inserido via Emenda Constitucional n.
3/93, e no artigo 28, parágrafo único da Lei n. 9.868/99 e no artigo 11 da Lei
9.882/99. A Emenda Constitucional n. 45, alterou o artigo 102, parágrafo 2º, da
Constituição Federal, prevendo o efeito vinculante da ação direta de
inconstitucionalidade e para as súmulas vinculantes.
O efeito vinculante no controle abstrato obriga a observância e
cumprimento da decisão por parte de todos os magistrados, membros do Poder
Executivo, e particulares, que estão vinculados ao entendimento do Pretório
Excelso nas ações em estudo. A previsão
do feito vinculante no novo Código de Processo Civil é mais restrita quanto aos
destinatários, só prevendo juízes e Tribunais.
Na minha dissertação de mestrado (PUC-SP), sobre efeito vinculante no
controle abstrato, defendi que há irremissível inconstitucionalidade dos
artigos 102, parágrafo segundo da Constituição Federal (com redação dada pela
Emenda n. 45/2004), 28, parágrafo único, da lei n. 9.868/99 e do 11, da Lei
9.882/99, por violação ao princípio da inafastabilidade do controle
jurisdicional, do juiz natural, das normas que preveem a possibilidade de
controle de constitucionalidade de leis e atos normativos de forma incidente, e
do princípio da separação de poderes. Mas ressaltei que a tendência era que o
STF declarasse a constitucionalidade dos dispositivos citados, tal como o fez na
RCL 1.880.
O efeito vinculante consagrado no art. 927 do NCPC restringe
demasiadamente a liberdade do magistrado, ao eliminar a possibilidade de
interpretação da norma jurídica de forma diversa da adotada no precedente, o
que é plenamente condenável. Tal situação viola a “impossibilidade da proibição
de interpretar”, citada por Engisch.
Não discuto que o efeito vinculante contribui com a celeridade e
uniformização das decisões, mas estas hipóteses inseridas pelo NCPC não são
compatíveis com a opção feita pelo Constituinte Originário pelos mesmos
fundamentos da previsão do controle abstrato.
Penso que a tendência no STF será admitir a constitucionalidade do
efeito vinculante previsto nas hipóteses criadas pelo NCPC, tal como fez na RCL
1.880.
Qual seu posicionamento acerca da nulidade das leis inconstitucionais?
O constituinte originário não estabeleceu expressamente qual a sanção
cominada à norma inconstitucional, o que caracteriza o princípio da nulidade do
ato inconstitucional como implícito, extraído do controle difuso de
constitucionalidade e das previsões na Constituição Federal (Constituição
Federal: art. 52, X; art. 102, I, “a”; art. 102, III, “b” e art. 97) que
estabelecem que a inconstitucionalidade é reconhecida por decisão declaratória,
considerando que as decisões declaratórias
reconhecem atos nulos , não anuláveis.
Poderia nos falar sobre o efeito repristinatório no Controle de
Constitucionalidade?
Efeito repristinatório significa que a norma pretensamente revogada pela
norma inconstitucional se mantém em vigor, constitui uma decorrência do
princípio da nulidade do ato inconstitucional .
É dizer, a norma inconstitucional não foi apta a revogar validamente a
lei anterior que tratava da mesma matéria, afigurando-se nula, desde o
nascimento, trata-se de uma pseudo-revogação.
Vem à propósito afirmar que repristinação e efeito repristinatório são
vocábulos inconfundíveis, pois a termos diversos não se deve atribuir o mesmo
conteúdo.
A repristinação é um fenômeno legislativo, que versa sobre vigência
prevista na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (artigo 2º,
parágrafo 3º). Enquanto que o efeito repristinatório é uma decorrência da
declaração de nulidade de um ato normativo, que não revogou validamente outro,
envolvendo duas leis e uma decisão judicial.
Em síntese, na repristinação temos um instituto que envolve a vigência
de três atos normativos, todos válidos, ao passo que no efeito repristinatório
temos duas leis e a posterior não revogou validamente a anterior, diante da sua
inconstitucionalidade.
O efeito repristinatório como decorrência do princípio da nulidade da
lei inconstitucional é aplicável no controle difuso, conforme já decidiu o STF.
O art. 927, § 3º do NCPC prevê que na hipótese de alteração de
jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores
ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos
efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. Qual sua
posição?
Há duas posições sobre a eficácia da modificação dos precedentes: i) é
retroativa; e ii) é prospectiva.
No sentido da retroatividade temos as lições de Fredie Didier Jr e Ravi Peixoto que , inspirados na doutrina
do direito inglês e norte-americano , apontam que em regra a eficácia temporal
do precedente é retroativa , fundamentando que o precedente é incorreto e
injusto, desde o início. Todavia, esta postura pode criar problemas pelo fato
de que os sujeitos de direito devem ter se comportado conforme ditava a Corte
que criou o precedente, gerando inúmeros prejuízos, desde financeiros
alcançando até a quebra de expectativas normativas
Adotamos a segunda posição, com a devida vênia. Entendemos que a
eficácia prospetiva dos precedentes vinculantes deve ser adotada como regra,
com fundamento no princípio da segurança jurídica, já que a eficácia retroativa
rompe com a exigência de que as leis e atos do Poder Público (incluindo as
decisões judiciais), não sejam lesivas à previsibilidade e calculabilidade
relativamente aos seus efeitos jurídicos, aplicando-se o princípio da proteção
a confiança , adotado pelo novo Código de Processo Civil (art. 927, § 4º),
elemento do princípio constitucional da segurança jurídica.
A adoção da eficácia retroativa na mudança dos precedentes vinculantes
gera uma situação de insegurança total, com a alteração do regime jurídico de
relações jurídicas já praticadas, mas aparentemente regidas pelo precedente
revogado. Em outras palavras, a revogação do precedente vinculante não deverá
atingir a vida, liberdade e propriedade de pessoas que confiaram na tese
jurídica nele adotada, tanto que celebraram atos jurídicos com fundamento nele.
Estas pessoas não devem suportar efeitos jurídicos diversos daqueles
consagrados no precedente vinculante que será modificado, acarretando inegável
descrédito à certeza do Direito e a estabilidade das relações jurídicas, em
prejuízo à segurança jurídica e ao Estado de Direito.
Fonte: Carta Forense
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